Arte Pública no ES: atores e processos criativos de escultores capixabas
Resumo: Este projeto integra a linha de pesquisa sobre a Arte Pública no ES, em especial, neste caso, a partir do estudo dos escultores principais que são responsáveis pela maior parte das obras no estado. O projeto aglutina uma série de investigações de caráter exploratório e filológico, envolvendo a pesquisa qualitativa e quantitativa que busca catalogar e compreender alguns aspectos da arte pública contemporânea no Espírito Santo a partir do ponto de vista de seus produtores, os artistas.
Buscaremos uma aproximação do tema a partir da produção dos artistas mais expressivos, aqueles com o maior número de obras no estado, buscando entender tendências e intencionalidades em seus projetos poéticos para essas obras.
Este projeto de pesquisa busca dar continuidade aos estudos que estão sendo feitos desde 2011 no Espírito Santo, especificamente no ramo que concerne ao estudo das obras instaladas em logradouros públicos no estado. Portanto, podemos afirma que é uma segunda fase de uma pesquisa em andamento no estado que visa mapear, inventariar e analisar a escultura em logradouros públicos e/ou ruas das principais cidades capixabas. Especificamente, busca compreender a produção escultórica dos artistas que tem dedicado sua produção a esta categoria de obra compartilhada com os transeuntes das cidades.
Quando observamos a produção escultórica em espaços públicos, em especial nas cidades mais velhas do estado, verificamos a não presença de objetos tridimensionais de expressiva antiguidade. Quando temos, como em São Mateus, norte capixaba, é um pelourinho na praça do porto antigo, mas relacionada à memória escravocrata da localidade que a um monumento erigido com a finalidade de ser monumento. O mesmo se dá quando olhamos para os velhos canhões nas cercanias da Igreja dos Reis Magos, em Nova Almeida: objetos utilitários abandonados em espaços e reconfigurados posteriormente como relíquia memorial de um determinado tempo. Houve uma produção escultórica no Espirito Santo colonial, mas esta produção escultórica sempre esteve relacionada à produção religiosa, para o interior das igrejas.
Se houve uma produção desses períodos, ela não chegou aos tempos contemporâneos. A maioria das obras que hoje temos em praças e espaços públicos capixabas são do final do século XIX e especialmente, da segunda metade do século XX, especialmente após a vinda do escultor italiano Carlo Crepaz (1919-1992). Crepaz vem com os padres do Santuário de Santo Antônio, mas sua obra se estende para além das obras pavonianas. Em 1951, Crepaz se torna professor da Escola de Belas Artes, atuando até inicio dos anos de 1980. Nesse período, podemos dizer que se cria no estado uma escola de bustos e estatuária centrado no ateliê de Crepaz e nas oficinas de escultura da Escola de Belas Artes. Com uma produção fiel ao estilo clássico dos monumentos e nenhuma estilização - a qual somente vai ser observada na arte pública capixaba após a atuação de seus discípulos, em especial o artista José Carlos Vilar, em parte de sua produção.
Assim, as mais expressivas obras de um período mais antigo no Espírito Santo, não completaram um século, apesar dos cerca de cincoséculos da ocupação do solo capixaba. Apesar de haver poucos estudos também sobre a obra de Crepaz, não nos interessa, neste momento, enfatizar sua produção, mas sim aquela que o sucedeu. Crepaz, com professor da Escola de Belas Artes e, posteriormente, da Escola de Artes da Universidade Federal do Espírito Santo, foi responsável pela formação de alguns escultores capixabas, especialmente em procedimentos de modelagem e fundição em bronze.
Depois da morte de Crepaz, seus alunos da Escola de Belas Artes vão começar a ocupar esse cenário capixaba, o que vem a ser ampliado com a chegada ao estado de outros escultores, alguns autodidatas.
Podemos destacar que a obra pública no Espírito Santo hoje ainda tem como seus principais expoentes o trabalho de bustos e estatuária de políticos e religiosos, evidenciando uma forte tendência moderna da escultura pública local. Poucas são as obras atuais que dialogam com as tendências mais contemporâneas de intervenção plástica nos logradouros públicos, ou em formas mais dinâmicas de trabalhar a memória das cidades capixabas. Quando presentes, essas obras de discussão mais contemporâneas são originárias de outras regiões no Brasil, como por exemplo, as obras de Amilcar de Castro (MG) no pátio da Cia Vale, ou ainda no pátio do Futuro Cais das Artes, aliás, obra abandonada no canteiro de obras do referido museu.
Assim, como dito antes, a atual pesquisa decorre de trabalhos investigativos anteriores sobre arte em espaços coletivos no estado. Nestes trabalhos sobre que objetos ocupam as praças e logradouros públicos no Espirito Santo, foi possível perceber que alguns artistas são responsáveis pela maioria dos objetos, dos bustos e estatuárias em geral, sejam elas tradicionais ou com algum traço de contemporaneidade.
Assim, da evidência desses nomes recorrentes, recortamos alguns que serão o foco inicial desta pesquisa, pois são os que representam de forma mais ampla, os diferentes interesses das cidades capixabas. São eles José Carlos Villar (também ex-professor de escultura do curso de artes da UFES e discípulo direto da tradição escultórica de Carlo Crepaz, sendo ex-aluno do mestre); Jânio Leonardelli (também ex-aluno de Crepaz e restaurador oficial de suas obras); Nilson Camizão e Hippolito Alves (artistas capixabas, e autoditadas); e o grego Ioanis Zavoudakis (estrangeiro radicado no ES e herdeiro de uma outra tradição escultórica). Juntos, estes artistas representam a quase totalidade das obras públicas acessíveis no Espírito Santo.
Assim, o objetivo principal é realizar o levantamento, inventário e preservação da fortuna poética desses escultores capixabas que atuam no campo da arte pública e monumentos, desde os anos de 1980 (José Carlos Villar, Nilson Camisão, Hipólito Alves, Jânio Leonardelli e Ioannis Zavoudakis), que tem uma produção expressiva, de forte caráter tradicional ou modernista tardio, e em sua maioria, com obras afastadas da questões da contemporaneidade da Arte Pública nacional ou internacional.
A metodologia está centrada no trabalho de campo para mapear e inventariar as obras destes artistas, utilizando os procedimentos do IPHAN para catalogação de bens materiais (o SICG). Assim, Este estudo compreende também um estudo documental e bibliográfico, mediando também entrevistas com estes artistas, bem como com pessoas que tiveram (ou tem) experiências práticas com a produção, crítica ou fomento do problema pesquisado. Deste modo, este projeto buscará localizar, mapear, identificar, e cartografar obras e documentos de processo de artistas escultores relacionados à arte pública capixaba. Também inventariaremos seus documentos de processo buscando digitalizar, transcrever e classificar esses documentos.
Para tal, serão utilizados os procedimentos metodológicos da pesquisa em história da arte de matriz filológica e formalista (Riegl, 1987) buscando não apenas recolher, datar e organizar o material artístico e documental, mas também visa descortinar influências e estilos por meio de um método histórico-comparativo. Como uma possibilidade de ampliar determinadas restrições do método filológico e de seu possível engessamento da leitura dessas obras investigadas, ampliaremos os estudos para uma análise fenomenológica, de base iconográfica da produção destes escultores no período investigado. Para tal, utilizaremos as bases teóricas da crítica de processo e os teóricos da Crítica Genética, tendo como base os pressupostos metodológicos apresentados por SALLES (1998 e 2008), HAY (1985, 1996 e 1999) e CIRILLO (2002, 2004).
Serão empregados métodos de coleta de dados centrados em duas frentes, uma primeira, junto aos artistas, buscando não apenas acesso ao seu processo criativo, mas a um inventário preliminar de suas obras; na segunda frente de trabalho, estaremos mapeando como essas obras se encontram no espaço público, verificando se seus projetos iniciais ainda se mantiveram ao longo do tempo, ou se sofreram alterações formais ou de uso por parte tanto dos transeuntes, mas também do poder público que regularmente move alguns desses monumentos como mobiliário urbano no sentido de re-significar os espaços da cidade (Maderuelo, 2001). No que se relaciona aos documentos de processo, inicialmente verificaremos, a partir do conjunto de artistas, quais têm o hábito de registrar o seu processo de criação.
O trabalho, como dito anteriormente, será desenvolvido em etapas: inicialmente, a partir de um recorte espaço temporal (artistas escultores que estão em atuação desde os anos de 1980 com obras em espaços públicos da região), iremos proceder à seleção primária das obras e documentos, assim como de entrevistas com esses artistas que, além da produção material de monumentos e obra públicas, têm o hábito de arquivar suas reflexões que geraram e geram suas obras essa etapa (coleta dos documentos de processo) se dará preferencialmente no ateliês dos artistas. Cumprida esta etapa, daremos início à digitalização do material que foi inventariado e selecionado.
Finda esta etapa, iremos proceder à leitura, análise e transcrição do material selecionado, que será em seguida disponibilizado no Banco de Dados do LEENA (laboratório de Extensão e Pesquisa em Arte), podendo, posteriormente, compor o acervo que está sendo sistematizado para acesso livre na Internet nos próximos dois anos. Depois dessa digitalização, o material será analisado visando ampliar esse acervo digital da Arte Pública e dos documentos de processo dos artistas capixabas, neste caso, com foco específico nos escultores de obras públicas, disponibilizadas em logradouros coletivos.
O trabalho será realizado em jornadas de quatro horas diárias, de segunda a sexta-feira. A primeira e a segunda etapa serão realizadas nas dependências dos ateliês dos artistas e a terceira na sala do Laboratório de Estudos e Ensino da Arte (LEENA), no Centro de Artes da Universidade Federal do Espírito Santo, que dispõem de infraestrutura necessária para o processamento dos dados necessários nesta etapa. Salientamos aqui que não é meta deste projeto a investigação de um projeto poético em específico, mas sim de catalogar o material disponível de um conjunto desses artistas capixabas de modo a criar um acervo que será disponibilizado, de modo a evitar o seu possível desaparecimento, ou para relembrar Bachelard, evitar que se percam no pântano da memória.
Como procedimento de inventário dos bens materiais (os monumentos), utilizaremos a metodologia do IPHAN para o inventário de bens materiais (o SICg Iphan). Essa metodologia vem sendo utilizada pelo grupo de pesquisa envolvido nesta pesquisa, permitindo geral um rico material não apenas sobre o artista e sua obra, mas especialmente sobre o seu processo de inserção na paisagem da cidade e no contexto cultural que a envolve.
Teremos os fundamentos teóricos e conceituais da pesquisa assim estabelecido: sobre os conceitos de monumento, serão trabalhados as reflexões de Riegl (1987), Choay (2001); e Cirillo (2008; 2009). Sobre as transformações do espaço público, a partir de Alves (2006); Abreu 2015; Duque (2001); Lynch (2006); Peixoto (2004); Seerpa (2007); Bachelard (1993); Calvino (2002) e Sitte (1992). Sobre aspectos do campo ampliado da escultura e do monumento, bem como de questões contemporâneas da intervenções e cultura, utilizaremos Krauss (1984); Kwon (2004) e Morin (2009); Sobre a estética e os conceitos dos documentos de processo, a partir de Salles (1998;1999;2000); Hay (1996;1999); Gresillon (1994); Sobre a questão do modernismo como tendência na obra dos artistas capixabas, usaremos Calinescu (1987); Greenberg (2001). Essa é uma referência básica que será ampliada e adequada ao longo do projeto.
Esperamos ao final dos trabalhos investigativos, ter fomentado a pesquisa sobre arte pública capixaba em nível de graduação, de iniciação científica e em nível de mestrado, efetivados por meio de artigos e materiais de divulgação que deem visibilidade e fomentem a cultura capixaba.
Data de início: 11/12/2018
Prazo (meses): 36
Participantes:
Papel | Nome |
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Pesquisador | MARCELA BELO GONÇALVES |
Pesquisador | CILIANI CELANTE ELOI JERONYMO |