Sistema da arte pós-digital: curadoria expandida e plataformas on-line
Resumo: A temática deste projeto se fundamenta no impacto derivado do desenvolvimento das modalidades informacionais de realização e fruição da arte e da cultura. Essas modalidades reúnem práticas orientadas pela influência direta ou indireta da notação e da automação computacional digital ou seja, a operação baseada em unidades discretas (ou descontínuas) de abstração e processamento de dados.
Não obstante a atenção dada ao digital nessa formulação, ressalta-se nas décadas recentes a revalorização dos elos existentes e novas propostas de hibridação com linguagens e paradigmas artesanais e industriais de representação (BISHOP, 2012). Isso ocorre sobretudo quando se observam as lógicas (proto)digitais subjacentes aos meios com predomínio de variações contínuas de sinais, ou quando se assume a necessidade irrefutável de instâncias analógicas para a compreensão efetiva dos códigos abstratos dos dispositivos computacionais (CRAMER, 2015).
Nesse sentido, inserem-se no recorte desta pesquisa não só práticas artísticas e curatoriais propriamente pensadas para a espaçotemporalidade virtual, como se observa na web arte, com obras e exposições do russo Alexei Shulgin da dupla belga-holandesa JODI e dos brasileiros Andrei Thomaz e Martha Gabriel. Além deles, incluem-se exemplos que conjugam as dinâmicas informacionais com processos socioculturais ou naturais, a exemplo de instalações e intervenções ambientais da dupla italiana Eva & Franco Mattes, do neozelandês Julian Oliver e dos brasileiros Gilbertto Prado, Giselle Beiguelman e Eduardo Kac.
O objetivo da pesquisa é identificar e avaliar questões relativas aos impactos sobre o sistema da arte, no que se refere especificamente ao exercício da crítica e da curadoria por agentes e instituições museológicas e expositivas, envolvendo a poética e a estética derivada da condição pós-mídia, pós-digital e pós-conceitual da arte. Quanto ao primeiro termo, seguimos as discussões sobre a inespecificidade dos meios da arte, conforme Rosalind Krauss (2000), Nicolas Bourriaud (2009), Lev Manovich (2013), Vilém Flusser (2002, 2008) e Domenico Quaranta (2013, 2022). O segundo termo é adotado a partir de Florian Cramer (2015), da dupla Scott Contreras-Koterbay e Lukasz Mirocha (2016), Lucia Santaella (2016) e contribuições compiladas por Pablo Gobira e Tadeus Mucelli (2017). Por último, o caráter pós-conceitual segue a teoria proposta por Peter Osborne (2013, 2018).
Entende-se neste projeto que as transformações qualitativas da arte pós-digital acompanham o tensionamento de ao menos duas tendências da cultura tecnológica contemporânea. Embora sejam transversais e não excludentes, essas linhagens estão historicamente organizadas em polos antagônicos a partir das teorias da ciência da computação e das práticas de engenharia de produtos e serviços digitais.
A primeira dessas vertentes é marcada pela ênfase na generatividade autopoiética dos sistemas computacionais. Essa preferência se sustenta na expectativa de um iminente contexto de processamento simbólico automático quase irrestrito da realidade. No campo da arte, os riscos dessa tendência ao automatismo é enfrentada por linguagens de cunho ativista, que procuram se apropriar ou subverter as capacidades de máquinas e redes de processamento e circulação da informação. Nesses casos, interroga-se o suposto destino de integração algorítmica que estabeleceria modos binários de transcodificação intersemiótica das artes e da economia, política, ciência e natureza.
Em outra direção, a precedência teórica é dada à interação extralinguística entre as distintas arquiteturas dos dispositivos e redes computacionais e os demais sistemas artificiais e naturais, incluindo-se então instâncias incomputáveis. Nesse caso, a reciprocidade das diferenças entre os arranjos sistêmicos é tomada como fonte para a emergência alopoiética, interativa e reticular de fenômenos de inteligência e vitalidade artificiais. Essa inclinação seria encontrada em projetos voltados à articulação entre domínios que não compartilham linguagens de intermediação, mas podem se afetar mutuamente pela transdução de energias que cruzam as suas materialidades.
A ambivalência entre a generatividade e a interatividade reticular suscita o foco de interesse deste projeto. A partir dele, planeja-se a investigação dos efeitos teórico-práticos sobre processos que constituem e influenciam o sistema da arte pós-digital conjunto de agentes e instituições envolvido na produção, circulação e colecionamento de obras de arte. Entre outras questões incluem-se inicialmente:
1. Que discussões teóricas ou práticas ativistas marcam no cenário atual a validação sistêmica do estatuto de arte, responsável por separar do conjunto disponível de produtos culturais certos objetos referenciais e colecionáveis?
2. Na diferenciação crítica e curatorial da arte pós-digital, como as especulações metafísicas acerca da atividade artística se relacionam com os fatos sociopolíticos e econômicos da arte e cultura contemporânea?
3. A validação atual do estatuto artístico modificaria retrospectivamente a interpretação de obras em linguagens artesanais ou industriais? Quais seriam as decorrências críticas para o conhecimento historiográfico?
Data de início: 03/01/2023
Prazo (meses): 60
Participantes:
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Nome |
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Aluno Doutorado | KARYNE BERGER MIERTSCHINK OLIVEIRA |
Aluno Mestrado | PAULO HENRIQUE OLIVEIRA DE SOUZA |
Aluno Mestrado | THAÍSSA DILLY ALVES |
Coordenador | DANIEL DE SOUZA NEVES HORA |